segunda-feira, 18 de abril de 2016

Impeachment de Dilma passa na Câmara

Depois de mais de cinco horas de sessão, oposição, conduzida por Eduardo Cunha, consegue os 342 votos necessários e derrota o governo



Às 23h07, o deputado Bruno Araújo, do PSDB de Pernambuco, proferiu seu sim. Araújo é o líder da oposição na Câmara. E ele deu o voto de número 342. "Quanta honra o destino me reservou de poder sair da minha voz" o voto contra a presidente, disse Araújo, lágrimas nos olhos. Depois de mais de cinco horas, a presidente Dilma Rousseff foi derrotada na Câmara dos Deputados. A maioria dos parlamentares, conduzidos pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha, decidiu que o processo de impeachment de Dilma deve seguir adiante e ser apreciado pelo Senado. Foi um sonoro fracasso do governo, completamente imobilizado por Cunha. A cantoria de "eu sou brasileiro, com muito orgulho, com muito amor" tomou conta da Câmara. Os deputados contrários ao impeachment calaram-se. 

A sessão foi aberta pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha, às 14h, pontualmente. Houve espaço para discursos dos líderes dos partidos. No plenário, parlamentares aproveitaram esse tempo para fazer selfies. Muitas selfies. Fizeram vídeos. Celulares e tablets estiveram em riste permanentemente. Boa parte deles estava embrulhada em bandeiras de seus estados. Os favoráveis ao impeachment ostentavam uma fita verde-amarela no colo. Os contrários, uma vermelha. Vários deputados levaram à Câmara seus familiares. O deputado Carlos Sampaio, do PSDB de São Paulo, por exemplo, levou a mulher. Mais selfies. Dudu da Fonte, do PP de Pernambuco, levou o filho pequeno - que não resistiu e tirou uma foto com o palhaço-deputado Tiririca, do PR de São Paulo.
Tiririca, aliás, foi uma das estrelas dessa pré-votação. Em seu segundo mandato, até esta noite ele jamais havia se pronunciado no plenário. Lá nos fundos, ele brincava com o deputado Mário Heringer, do PTD de Minas Gerais, sobre como votaria. Mas não revelava sua posição (ele acabou votando sim). No meio do plenário, do lado direito, Roberto Jefferson, condenado a sete anos de prisão no processo do mensalão e contemplado com um indulto da pena, ria e papeava com Miro Teixeira, da Rede do Rio de Janeiro. Jefferson foi o responsável por expor o esquema de corrupção. Ele era cumprimentado efusivamente por colegas em seu retorno à Câmara, agora como pai da deputada Cristiane Brasil, do PTB. Pelo menos dez senadores atravessaram do Salão Azul para o Verde para acompanhar a votação. A maioria era da oposição. O ânimo do lado dos pró-impeachment era de confiança. "O balcão de compra de votos jogou contra eles. Ninguém quer passar para a história como vendido", dizia Danilo Forte, do PSB do Ceará.
A votação começou às 17h40. Começou pelo estado de Rondônia e seguiu para o Rio Grande do Sul. Depois de votar "sim", o deputado Jerônimo Goergen, do PP gaúcho, fez um telefonema e repetiu para o interlocutor o que havia dito no microfone: "Eu votei assim!". Havia um deslumbre entre os parlamentares com seus 10 segundos de história. Centenas usaram a palavra para falar em Deus e religião. Para mencionar nomes de parentes. Para votar em nome de sua "mãezinha". Em nome da "paz em Jerusalém", dos "corretores de seguro". A única coisa não tolerada era exagero no uso do tempo. Quem se excedia era vaiado - independentemente do conteúdo do discurso.
Conforme os votos pró-impeachment se acumulavam nos primeiros estados, o deputado do PTdoB Silvio Costa, vice-líder do governo, comentava, tentando dar um ar de tranquilidade: "Viu? Falei! Tudo dentro do previsto!". Até o último minuto ele dizia acreditar na vitória. A tal ponto que chegou a repreender o comunista Orlando Silva (PCdoB-SP) que, após votar, deu entrevista dizendo estar resignado sobre a derrota. "Agora vamos ver no Senado", afirmou Silva. Silvio Costa o repreendeu na frente da imprensa, afirmando que, pelas suas contas, o jogo ainda poderia ser ganho. Andava bufando pelos cantos do Plenário como se fosse ele o petista mais ultrajado pela situação. "Já ganhamos. Não tenho dúvida. O impeachment já está derrotado. Vocês vão ver", bradava. O petista Arlindo Chinaglia fazia o mesmo. Mas, mesmo antes dos votos começarem a ser contabilizados, governistas faziam seus últimos cálculos com desânimo. Constatavam que não teriam mais que 130 parlamentares contra a admissibilidade do processo de impeachment. Verificavam que o índice de traição havia saltado às alturas durante a noite: 13 deputados que haviam afirmado votar a favor do governo haviam mudado de lado em menos de 12 horas. A conta era, inclusive, mais pessimista que a da oposição, que calculou 9 votos recuperados ao longo da madrugada.
E começaram as traições. Foram ao menos oito deputados que eram vistos como indecisos ou como votos contra o impeachment votaram SIM. São eles: Giacobo (PR/PR), Alfredo Nascimento (PR/AM), José Priante (PMDB/PA), Hissa Abrahão (PDT/AM), Toninho Wandscheer (Pros-PR), João Arruda (PMDB-PR), Flávia Morais (PDT/GO) e José Reinaldo (PSB/MA). Três delas foram mais dolorosas aos governistas. Giacobo e José Reinaldo eram, até a noite de sábado, votos contra o impeachment - não eram indecisos nem haviam prometido abstenção ou ausência. A que mais irritou Silvio Costa foi a do deputado Giacobo, que havia acabado de indicar um aliado no balcão de cargos do governo. A nomeação havia saído em Diário Oficial na sexta-feira. O posto era a direção da Usina Hidrelétrica de Itaipu. "O cara foi um canalha", gritava Costa. Além deles, Alfredo Nascimento fora ministro dos Transportes de Lula e Dilma. A surpresa foi grande. A oposição comemorou como se num gol de final de Copa do Mundo. Passava das 21h30 quando o cenário de derrota do governo foi ficando mais claro. Não havia sequer 100 votos contra o impeachment. Na última fila do plenário, ao ouvir que poderia ser o voto 342 pelo impeachment, Mário Negromonte Filho se agitou. Filho do ex-ministro das Cidades de Dilma, Mário Negromonte, o deputado levantou e foi ao colega Roberto Brito que, com uma lista, controla os votos. "Não sou eu! Vai dar em Pernambuco". Ele não queria ser o "não" quando todos esperavam o "sim".
O PT estava acuado: os pró-Dilma ficaram apenas no lado esquerdo do plenário. Quando tentavam gritar, eram superados pelos outros. A derrota era palpável. Quando o placar marcou 300 votos pró-impeachment, o líder do governo na Câmara, Zé Guimarães (PT-CE), saiu ao salão verde para dar uma coletiva. Disse que não tinha mais volta e que agora era hora de batalhar pelo Senado. Enquanto Guimarães jogava a toalha, a oposição vivia um estado de quase torpor. A tropa de choque pró-impeachment, representada pelos deputados Carlos Sampaio (PSDB-SP), Mendonça Filho (DEM-PE) e Rubens Bueno (PPS-PR), não arredou o pé do centro do Plenário, envoltos em bandeiras, cálculos e centenas de mensagens de Whatsapp -- muitas vindas de lideranças de movimentos de rua pelo impeachment, como o MBL e Vem pra Rua. Mendonça, um dos mais ávidos frequentadores do Salão Verde, não pisou no carpete desde que a sessão começou. "Não tem mais volta. O que acontece hoje é prova de que o governo mentia quando dizia, no fim de semana, que havia conseguido reverter. Tudo mentira", diz. Com a derrota do governo, o processo de impeachment da presidente Dilma segue para o Senado. 

Época

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